Eu, um homem comum


O despertador ao lado da cama toca todo os dias as 06h20min e o mundo começa novamente. Sim, o sono é um desligamento do corpo, talvez a minha alma vaguei por aí durante a sonolência. Talvez ela faça aquilo que não tive coragem de fazer, aquilo que não soube como fazer. Mas voltando ao alarme. Seria ele bendito ou maldito? O meu toca no celular. Aquela música que nunca tocou em nenhum outro lugar é a primeira coisa que escuto no dia. Essa junção maluca de sons, que não saberia cantarolar de cabeça, é a responsável por me trazer de volta ao jogo. Vou me encorajando a ressuscitar meu corpo, músculo por músculo, começando pela primeira espreguiçada das costas, empurrando o peito pra frente e o rosto sinalizando aquele mal estar da preguiça. Se fôssemos mais sábios, saberíamos o quanto é profundo esse gesto, talvez não precisaríamos de mais nenhum aforismo pra vida toda. A vida toda é isso. É essa coragem de levantar de manhã! Tudo é difícil, no começo, como levantar de manhã, depois a gente vai levando, pegando o ritmo. 

Mas seguindo, faço o café. Até aí só fui escovar os dentes. Do banheiro a feitura do café estou praticamente ainda em transe, chego a pensar que tudo não passa de um sonho. Enquanto a água ferve na panela, já adoçada, vou retomando verdadeiramente a consciência há tempo de escutar a ebulição que clama pelo pó de café. Lavo a garrafa, encho-a com o café do dia e a ponho a mesa. Em seguida tomo meu banho. É um ritual perfeito. Bem civilizado. Lavo-me bem. A toalha ainda pouco molhada do banho da noite interior me incomoda um pouco, mas já me acostumei. Seco-me. Torno a por o short que estava ao corpo e vou a mesa. Café com leite e pão, ou bolacha e muito de vez em quando um bolo. 

Realizado o ritual fundamental sigo a outro. Me arrumo para sair pro trabalho. Cueca lavada, calça jeans para uma semana. Camisa. Ajeita o cabelo. Desamassa a camisa. Perfume. Bom dia aos que vou encontrando pela casa, sem tempo pra uma conversa já parto em direção ao carro. Todo dia me atraso. Faz parte do ritual. Entro no carro, esse, apesar de já está pago, me lembra que já tá ficando velho e a propaganda me aterroriza todo dia. Eu já sonho com um carro novo. Mas tenho resistido com muita força. Tenho tentado aprender a me contentar com o que tenho. Mas não e fácil. Parto em direção ao trabalho.

No carro escuto as minhas adoráveis músicas. Como qualquer um, as tenho como as melhores e correspondentes ao gosto refinado e particular que é o meu. O tempo de viagem é de 25min. Sem imprevistos vou chegar bem no serviço. Bom dia. Bom dia. Bom dia. Dependendo do dia dou de 4 a 7 "bom dias" na entrada. Eu ate gosto disso. Se não fosse eu já ter gravado de que forma cada um responde não teria problema algum. O trabalho é rotineiro. Realizável. Não me sinto de forma alguma especial por faze-lo, é pura sobrevivência. Mas de qualquer forma me sinto privilegiado. Pois só trabalho 6h por dia. Isso não é pra todo mundo. 14h saiu. Entro no carro de novo. Ligo o som do carro de novo. Tá calor mas tem o ar condicionado. Vejo os universitários "andando a pé" e sei que eles querem viver a minha vida. Sou funcionário público. Passo por eles de vidros fechados mas sei que sou simbólico. Eles querem ser eu. Querem a minha vida. Querem a minha posição. É assim que funciona. Já fui universitário que ia a pés pra aula. 

De volta a casa, descanso um pouco. O corpo cansa de qualquer jeito. Tento dormir novamente. Geralmente não consigo. Quando levanto/acordo vejo o que tem pra fazer em casa. Tarefas domésticas nunca acabam. Uma limpeza. Uma comida a se fazer ou para ir comprar. Sempre há uma tarefa. Daqui a pouco preciso cuidar do meu corpo. Malhar, correr, jogar futebol. Algo deve ser feito. Antes  de encerrar o dia também procuro trocar alguma ideia com alguém. É importante pra se sentir vivo ouvir um pouco da vida do outro, a gente compara as dores, vê que são parecidas e consegue seguir em frente. A noite é hora de ler um pouco, preferencialmente sobre a vida que não venho vivendo. Fico imaginando como seria se fosse de outro jeito.  

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