O relato mais difícil da minha vida...

 


Em janeiro desse ano de 2020 fui diagnosticado com ansiedade associada à depressão! Esse é o núcleo da história. Mas não é aí que a coisa começa.

 

Eu sempre soube que eu era uma pessoa diferente, mais introspectiva, um pouco mais difícil, com o senso de responsabilidade acima da média, disciplinado com meus estudos e um tanto medroso. Um medo abstrato. Medo de mudar, medo de escolher, medo de tomar alguma decisão, medo de estar errado nas minhas escolhas... Pra mim sempre foi difícil tomar grandes decisões. Foi difícil ir morar em Belém pra estudar, foi difícil ficar longe da minha família e dos meus amigos, foi difícil escolher um curso superior, foi difícil largar um curso superior, foi difícil encarar ser professor, foi difícil largar um cargo público concursado, foi difícil recomeçar tantas vezes...

 

Mas tudo isso, você pode pensar, é normal... é difícil pra todo mundo... Mas eu me comparava com esse “todo mundo” e achava que algo em mim era diferente, eu percebia que pra mim tudo era mais sofrido, que demorava mais pra passar, que demorava mais pra eu superar... A ansiedade mostrou a cara pela primeira vez na minha vida durante a preparação para o concurso do TJPA que fiz no fim de 2014 e que com muito suor e sofrimento consegui a aprovação. Acontece que durante os estudos, com a minha super insegurança e a grande pressão que eu mesmo me fazia, eu tive a primeira crise. Num fim de tarde qualquer, faltando três meses pra prova, eu fui sendo tomado por um sentimento incompreensível de insegurança e medo que começou me tirar o ar literalmente. Durante a crise eu não conseguia respirar direito e aquilo ia ficando pior à medida que eu ficava mais nervoso, eu achei que iria apagar... Mas passou, fui ao hospital, fui medicado, e tive ali a acolhida da minha família. Pus a cabeça no lugar e chamei aquele episódio de uma crise de estresse, mas o tempo passou e fui percebendo que aquilo permanecia ali, dentro de mim, só esperando uma oportunidade.

 

Depois que passei no concurso eu consegui relaxar durante um tempo. Aguardei ser chamado, tomei posse, tudo parecia bem. Depois que comecei a trabalhar e, teoricamente, “resolvi a minha vida”, pois finalmente tinha a minha almejada “segurança financeira” comecei a notar que eu não conseguia me sentir bem, feliz, satisfeito com a minha vida. Com isso eu comecei a realmente me sentir incomodado. Afinal de contas o que estava faltando? Sabe, eu cheguei “lá", fiz tudo o que esperavam de mim. Cumprir todos os papéis e ainda assim, não me sentia feliz...

 

Essa busca pela felicidade sempre foi um tabu na minha vida. Li muitos livros sobre o tema, assisti muita coisa, conversei, observei, ser feliz se tornou uma paranoia pra mim. Tudo porque eu nunca conseguia me sentir realmente feliz, fizesse o que eu fizesse, no final eu voltava sempre para o mesmo lugar: insatisfação, vazio, angustia... Se vocês soubessem o quanto eu invejo ver vocês felizes vivendo suas vidas, sabe. Cada um com seu jeito de ser. Uns sendo felizes e consumando suas vidas no futebol, outros na igreja, outros na cultura, outros na leitura, outros no trabalho, outros no amor... seja lá no que for, eu sempre quis sentir isso! Sempre quis achar esse lugar ou esse fazer que me completasse, mas infelizmente eu não nasci com essa sorte. Eu sou do time dos que vieram pra sofrer um pouco mais, estou tentando aceitar isso... E olhem, quem me conhece um pouco mais sabe o quanto sou empenhado! Aqui em Irituia essa minha inquietação me levou a fazer muita coisa... Montei banda de rock, toquei rock no palco da praça, montei grupo de carimbó e tocamos com ele na praça, gravamos música, participei da fundação da Quemtedera, tentei ser escritor e acabei escrevendo e escrevo até hoje muita coisa, fiz protesto, entrei na política, gosto de ler e jogar bola, assisto filmes e séries, trabalho, faço as coisas em casa, faço Live, encho o saco no Facebook... E sabe por que isso tudo? Tudo é uma fuga desse vazio, dessa sensação de falta e incompletude. Em nenhuma dessas atividades mencionadas eu encontrei o que muito de vocês encontram: a tal da satisfação e do contentamento.

 

Durante anos eu achava que esse sentimento era só o meu jeito de ser, assim como foi o jeito de ser de muita gente que admiro até hoje e que sempre me vi representado em suas obras: Renato Russo, Belchior, Raul Seixas, Fernando Pessoa... Eu sempre me reconheci em boa parte do trabalho desse povo são aí... eu achava até bonito saber que eu era um pouco parecido com o que se dizia na obra deles, mas como falei anteriormente, com o tempo eu fui tomando ciência que eu não estava bem, isso porque tudo isso começou a me incomodar de verdade.

 

No final de 2019, após uma porção de conflitos na minha pessoal, depois de vários outros episódios claros de total descontrole emocional, eu resolvi buscar ajuda psiquiátrica. Sim! Eu também tive o mesmo preconceito que vocês estão tendo agora. Relutei muito. Não queria aceitar que eu estava doente! Todavia o meu dia-a-dia estava insuportável. Eu já não me reconhecia mais. Além de todos os sintomas já mencionados, comecei a apresentar também um quadro de irritação e impaciência muito grande, muito grande mesmo. Tudo em minha volta me irritava, talvez mais do que deveria, eu não tinha filtro mais, tudo me amargurava e me deixava com o sentimento de ter a pior vida do mundo.

 

Passado tudo isso, depois de passar uns dias digerindo o diagnóstico do médico e de iniciar o tratamento com medicamentos, já em janeiro de 2020, eu comecei a redescobrir a vida. Vocês não tem noção da minha felicidade ao dizer pra minha terapeuta (psicóloga) que eu estava me sentido feliz por não estar sofrendo mais... Vocês não tem ideia do que é isso, apesar dela me dizer que isso não era motivo para felicidade, mas eu insistia, estava bom pra mim. Só de não está sofrendo sem haver um motivo aparente, estava ótimo. Percorri o inicio da pandemia “voando” de estabilidade emocional, tranquilo, vivendo a vida de boa, apesar do mundo está uma loucura. Porém, alegria de pobre dura pouco. Percebi que lá por maio/junho os efeitos do medicamento já não estavam segurando a “parada”. O fantasma estava de volta me espreitando e eu não podia voltar à médica, eu deveria ter feito todo um acompanhamento, mas por conta do ápice da Pandemia acabei deixando de ir. Junte a isso toda uma turbulência que vinha e que estou passando na vida pessoal e bingo: Ela voltou. Tô de novo encarando essa diaba dessa ansiedade/depressão com toda a crueldade que ela tem.

 

É assustador meu povo e é muito difícil para quem é dito “normal” entender e conviver com alguém que apresente esse problema. Apesar de tudo isso, eu sou um cara de sorte porque tenho muita gente abençoada do meu lado, além é claro de condições financeiras para bancar o tratamento, que por sinal continua, vou voltar na doutora que me atende e relatar quase que tudo isso que agora escrevo. Mas falando de pessoas, eu agradeço demais por ter os amigos que tenho, tanto àqueles que tive coragem de há muito tempo contar essa parada e que sempre estiveram presentes me dando apoio, quanto aos demais amigos que mesmo sem saberem me fazem um bem danado por me fazerem rir das nossas brincadeiras de bom gosto pelo Zap. Agradeço muito também a quem passou pela minha vida e foi comigo até onde foi possível ir. E acima de tudo, como é bom ter a família que eu tenho. Eles são meu melhor remédio. Tá parecendo texto de despedida mas não é. Não estou na situação daqueles que pensam em suicídio como solução, não, graças a Deus, o que eu quero é me livrar dessa merda e conseguir viver bem, viver a minha vida, minha pequena vida de irituiense, sossegado, perto de vocês que gostam de mim, perto da minha família, jogando meu futsal e xingando os outros na beira do campo, tocando, compondo e escrevendo, lendo e tudo mais que compõe essa celeuma que é a minha vida. Ainda que eu nunca consiga ser feliz como vocês eu quero pelo menos viver sossegado, não preciso de mais dinheiro, não preciso de status, não preciso de nada a mais de material, eu só quero viver sem sofrer tanto... Só isso.

 

Mas agora, já se encaminhando pro final desse relato pessoal, vocês devem estar se perguntando (ou talvez não, sei lá): por que isso agora? Por que vós resolvestes falar? E eu respondo: porque é foda! Porque essa porra dói e só falta enlouquecer a pessoa quando dá a crise, porque parece que eu não vou conseguir aguentar conviver com essa confusão de coisas se misturando tudo de uma vez na minha cabeça, porque sei que esse tema é complexo e causa vergonha em quem sofre disso e porque quero aqui estender a minha mão a você que chegou até aqui no final desse texto e se reconheceu em muitas das coisas aqui narradas! Eu quero me aproximar de você e te ajudar assim como eu recebo ajuda! Quero poder te ouvir e te falar que eu sinto a mesma coisa e que isso não é a gente, isso é uma doença que tem tratamento e que é possível conviver com ela se bem amparado. Esse meu gesto aqui é uma tentativa de dar outro significado a essa minha situação, é terapêutico pra mim e pra você que tá passando por isso.

 

Eu me chamo Helton Jones Monteiro da Rocha, resido em Irituia, tenho 34 anos de sonho e de sangue... Se precisares de ajuda conte comigo, sem julgamento, sem preconceito, apenas acolhimento. Espero que quando esse texto chegue a você eu já esteja bem ou pelo menos bem nesse momento, porque às vezes é um dia nosso e outro dia dessa diaba. É assim que a gente vive na crise. Faça exercício físico diariamente, se distraia, procure pessoas que te façam rir ou que te deem segurança e faça você se sentir forte o bastante para passar pelos piores momentos, ocupe seu tempo, reconheça seus gatilhos e evite-os, e o essencial: não desista.

 

Ps1. Ontem, logo depois do banho, inicio da noite, eu resolvi bater um papo com Deus. Fazia mais de 15 anos que não o buscava. Sempre me achei racional o bastante pra viver essa vida, mas no desespero pedi a Deus que tirasse esse sofrimento de mim. Antes de dormi orei de novo, com vergonha, assim como aquele filho pródigo que retorna ao pai, ontem eu resolvi buscar a Deus e me senti melhor.

 

Ps2. “Quem vê meme não vê coração”. Fico imaginando como quem só me conhece por rede social deve está agora? Pessoal depois de ler esse texto. Dirão: “como pode esse bicho... tu é doido é!?”; “nunca imaginei”; “é papo”; “quer se aparecer (meus haters)”; “rapaz...”; “mana, tá sabendo? (a fofoqueira)”... e por ai vai... O que vai pro Face é sempre os recortes de felicidade, ninguém tem coragem de postar sobre seus problemas, pois problema não causa admiração e o que a gente que é ser admirado.    

 

 Famoso que tiveram ou que estão enfrentando o problema:

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